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Posts Tagged ‘Veríssimo’

Segundona feriadão!! Já que estou em casa, posso publicar aqui mais um texto do Veríssimo. Continuando o mesmo livro que utilizei ontem.

Sexo e futebol

A dissertação nada-a-ver de hoje é: no que o sexo e o futebol se parecem?

No futebol, como no sexo, as pessoas suam ao mesmo tempo, avançam e recuam, quase sempre vão pelo meio mas também caem para um lado ou para o outro e às vezes há um deslocamento. Nos dois é importantíssimo ter jogo de cintura.

No sexo, como no futebol, muitas vezes acontece um cotovelaço no olho sem querer, ou um desentendimento que acaba em expulsão. Aí um vai para o chuveiro mais cedo.

Dizem que a única diferença entre uma festa de amasso e o cobrança de um escanteio é que na grande área não tem música, porque o agarramento é o mesmo, e no escanteio também tem gente que fica quase sem roupa.

Também dizem que uma das diferenças entre o futebol e o sexo é a diferença entre camiseta e camisinha. Mas a camisinha, como a camiseta, também não distingue, ela tanto pode vestir um craque como um medíocre.

No sexo, como no futebol, você amacia no peito, bota no chão, cadencia, e tem que ter uma explicação pronta na saída para o caso de não der certo.

No futebol, como no sexo, tem gente que se benze antes de entrar e sempre sai ofegante.

No sexo, como no futebol, tem o feijão com arroz, mas também tem o requintado, a firula e o lance de feito. E, claro, o lençol.

No sexo também tem gente que vai direito no calcanhar.

E tanto no sexo quanto no futebol o som que mais se ouve é aquele “uuu”.

No fim, sexo e futebol só são diferentes, mesmo, em duas coisas. No futebol, não pode usar as mãos. E o sexo, graças a Deus, não é organizado pela CBF.

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Domingo, fim de semana, dia de um textinho do Veríssimo. 🙂

A claúsula do elevador

Porque eram precavidos, porque queriam que sua união desse certo, e principalmente porque eram advogados, decidiram fazer um contrato nupcial. Um instrumento particular, só entre os dois, separado das formalidades usuais de um casamento civil. Nele estariam explicitados os deveres e os compromissos de cada um até que a morte – ou o descumprimentos de qualquer uma das cláusulas – os separasse.

Quando chegaram à parte do contrato que trataria da fidelidade, ele ponderou que a cláusula deveria ter uma certa flexibilidade. Deveria prever circunstâncias aleatórias, heterodoxas e atenuantes. Em outras palavras, oportunidades imperdíveis. E exemplificou.

– Digamos que eu fique preso num alevador com a Luana Piovani. Depois de dez, quinze minutos, ela diz “Calor, né?”, e desabotoa a blusa. Mais dez minutos e ela tira toda a roupa. Mais cinco minutos e ela diz “Não adiantou”, e começa a desabotoar a minha blusa… O contrato deveria prever que, em casos assim, eu estaria automaticamente liberado dos seus termos restritivos.

Ela concordou, em tese, mas argumentou que a licença pleiteada deveria ser específica, rechaçando a sugestão dele de que se referisse genericamente a “Luana Piovani ou similar”. Ficou decidido que ele estaria automaticamente liberado da obrigação contratual de ser fiel a ela no caso de ficar preso num elevador com a Patrícia Pillar, a Luma de Oliveira ou uma das duas (os as duas) moças do “Tchan”, além da Luana Piovani, se o socorro demorasse mais de vinte minutos. Isto estabelecido, ela disse:

– No meu caso…
– Como, no seu caso?
_ No caso de eu ficar presa num elevador com alguém.
– Quem, por exemplo?
– Sei lá. O Maurício Mattar. O Antônio Fagundes. O Odvan…
– O Odvan não!

Foi uma negociação longa e difícil, durante a qual ele vetou vários nomes, até ser obrigado a concordar com um, por absoluta falta de argumentos. Ela estaria liberada de ser fiel a ele se um dia ficasse presa num elevador com o Chico Buarque. Mas só com o Chico Buarque. E só se o socorro demorasse mais de uma hora!

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Terceiro texto do Luis Fernando Veríssimo aqui no blog. Esse texto é do último livro de crônicas que a Editora Objetiva lançou.

Orgias

A idéia que se tem das antigas orgias romanas é a do completo abandono aos instintos, um vale-tudo regido pela espontaneidade e só limitada pela sociedade, ou pela imaginação lúbrica de cada um. Os convites diriam “venham como estiver e saia como puder” e tudo que acontecesse entre o primeiro “evoé” e o último arroto seria obra da improvisão e do acaso. Mas é claro que precisava haver um mínimo de premeditação nas bacanais, nem que fosse para assegurar que no momento em que o imperador estalasse os dedos e pedisse “17 escravas núbias e um cabrito!” não criasse correria e embaraços.

– Essas escravas núbias vêm ou não vêm?
– Estamos providenciando, estamos providenciando!
– E o cabrito?
– Pegamos emprestado da orgia ao lado, mas ele precisa de meia hora para se recuperar!

Pouca gente sabe que existia, na Roma Antiga, até a profissão de organizador de orgias, ou baccanum, profissional muito valorizado, tanto que é daí que vem a palavra “bacana”, mas não digam que fui eu que disse. Os baccanae funcionavam assim como os modernos bufês, que se encarregam de todos os detalhes de uma recepção. Só que as exigências da época, claro, eram um pouco diferentes.

– Precisamos de 2.000 pés para a orgia de sábado.
– Você quer dizer canapés.
– Não, pés mesmo.
– Esse Calígula…

Um bom baccanum sabia organizar uma orgia até os mínimos detalhes e embora não pudesse determinar o comportamento individual dos convidados, entregues aos seus loucos prazeres, fazia o possível para que a festa transcorresse de forma organizada, que nada faltasse e que tudo ocorresse na hora devida. Antes de começar a orgia, um baccanum normalmente reunia sua equipe e o pessoal contratado e dava as últimas instruções.

– Anões besuntados, deste lado. Por favor, tentem manter a máxima discrição até a hora de entrar no salão. Lembre-se de que vocês entram depois da briga de camelos. Antes disso houve a guerra de ovos entre os dois lados da mesa, é possível que o chão ainda esteja escorregadio. E só Deus sabe o que os camelos farão no chão durante a briga, portanto, muito cuidado para não escorregar. Na última orgia, um dos anóes deslizou diretamente para o colo de Flávia Calpúrnia e foi decapitado antes que pudesse se explicar. Bailarinas, onde estão as bailarinas? Ah, aí estão vocês. Vocês entrarão dentro dos bois assados. Não se preocupem, serão costuradas dentro dos bois depois de assados, salvo alguma última ordem em contrário. No momento em que que os bois forem abertos, saiam dançando, e sem cara feia. Obrigado. Escravas núbias: façam o que fizerem, por favor não irritem o cabrito! Vocês têm só 15 minutos para o número, e quando fica irritado o cabrito não consegue se concentrar. Deixa ver. Falta alguma coisa? garçons, mostrem as mãos. Muito limpas! Quero ver essas mãos sujas. Sujas! Muito bem. Todos a postos e esperem o gongo.

Quando se diz que o Brasil está parecendo uma orgia, não se está sendo exato. De certa forma isso aqui sempre foi uma orgia, uma simpática convivência de apetites mais ou menos desenfreados, mais ou menos safados. O que mudou é que não parece haver mais a menor coerência no deboche. Os anões besuntados entram e saem à hora que querem, a Flávia Calpúrnia pula no pescoço do cabrito e o arrasta para um canto, e vá tentar conseguir um garçom para trazer o leitão caramelado. Quer dizer, orgia está certo. Mas um mínimo de organização!

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Segundo crônica publicada aqui no Blog, hoje de um dos livros mais vendidos do autor, que ficou praticamente 1 ano na lista dos livros mais vendidos no Brasil.

Trapezista

Querida, eu juro que não era eu. Que coisa ridícula! Se você estivesse aqui – Alô? Alô? – olha, se você estivesse aqui ia ver a minha cara, inocente como o Diabo. O quê? Mas como, ironia? “Como o Diabo” é força de expressão, que diabo. Você acha que eu ia brincar numa hora desta? Alô! Eu juro, pelo que há de mais sagrado, pelo túmulo de minha mãe, pela nossa conta no banco, pela cabeça dos nossos filhos, que não era eu naquela foto de carnaval no Cascalho que saiu na Folha da Manhã. O quê? Alô! Alô! Como é que eu sei qual é a foto? Mas você não acaba de dizer… Ah, você não chegou a dizer… ah, você não chegou a dizer qual era o jornal. Bom, bem. Você não vai acreditar mas acontece que eu também vi a foto. Não desliga! Eu também vi a foto e tive a mesma reação. Que sujeito parecido comigo, pensei. Podia ser gêmeo. Agora, querida, nunca, em nenhum momento, está ouvindo? Em nenhum momento me passou pela cabeça a idéia de que você fosse pensar – querida, eu estou até começando a achar graça -, que você fosse pensar que aquele era eu. Por amor de Deus. Pra começo de conversa, você pode me imaginar de pareô vermelho e colar havaiano, pulando no Cascalho com uma bandida em cada braço? Não, faça-me o favor. E a cara das bandidas! Francamente, já que você não confia na minha fidelidade, que confiasse no meu bom gosto, poxa! O quê? Querida, eu não disse “pareô vermelho”. Tenho a mais absoluta, a mais tranquila, a mais inabalável certeza que eu disse apenas “pareô”. Como é que eu podia saber que era vermelho se a fotografia não era em cores, certo? Alô? Alô? Não desliga! Não… Olha, se você desligar está tudo acabado. Tudo acabado. Você nem precisa voltar da praia. Fica aí com as crianças e funda uma colônia de pescadores. Não, estou falando sério. Perdi a paciência. Afinal, se você não confia em mim não adianta nada a gente continuar. Um casamento deve se… se… como é mesmo a palavra?… se alicerçar na confiança mútua. O casamento é como um número de trapézio, um precisa confiar no outro até de olhos fechados. É isso mesmo. E sabe de outra coisa? Eu não precisava ficar na cidade durante o carnaval. Foi tudo mentira. Eu não tinha trabalho acumulado no escritório coisíssima nenhuma. Eu fiquei sabe para quê? Para testar você. Ficar na cidade foi como dar um salto mortal, sem rede, só para saber se você me pegaria no ar. Um teste do nosso amor. E você falhou. Você me decepcionou. Não vou nem gritar por socorro. Não, não me interrompa. Desculpas não adiantam mais. O próximo som que você ouvir será do meu corpo se estatelando, com o baque da desilusão, no duro chão da realidade. Alô? Eu disse que o próximo som.. que… O quê? Você não estava ouvindo nada? Qual foi a última coisa que você ouviu, coração? Pois sim, eu não falei – tenho certeza absoluta que não falei – em “pareô vermelho”. Sei lá que cor era o pareô daquele cretino na foto. Você precisa acreditar em mim, querida. O casamento é como um número de… Sim. Não. Claro. Como? Não. Certo. Qunado você voltar pode perguntar para o… Você quer que eu jure? De novo? Pois eu juro. Passei sábado, domingo, segunda e terça no escritório. Não vi carnaval nem pela janela. Só vim em casa tomar um banho e comer um sanduíche e vou logo voltar para lá. Como? Você telefonou para o escritório? Meu bem, é claro que a telefonista não estava trabalhando, não é, bem? Ha, ha, você é demais. Olha, querida? Alô? Sábado eu estou aí. Um beijo nas crianças. Socorro. Eu disse, um beijo.

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Essa idéia surgiu faz alguns dias, entretanto eu precisava de um tempo para achar os livros e explicar a intenção aqui. Mas antes disso leiam o texto abaixo:

A Espada

Uma família de classe média alta. Pai, mulher, um filho de sete anos. É a noite do dia em que o filho fez sete anos. A mãe recolhe os detritos da festa. O pai ajuda o filho a guardar os presentes que ganhou dos amigos. Nota que o filho está quieto e sério, mas pensa: “É o cansaço.”Afinal ele passou o dia correndo de um lado para o outro, comendo cachorro-quente e sorvete, brincando com os convidados por dentro e por fora da casa. Tem que estar cansado.

 – Quanto presente, hein, filho?
– É.
– E esta espada. Mas que beleza. Esta eu não tinha visto.
– Pai…
– E como pesa! Parece uma espada de verdade. É de metal mesmo. Quem foi que deu?
– Era sobre isso que eu queria falar com você.

O pai estranha a seriedade do filho. Nunca o viu assim. Nunca viu nenhum garoto de sete anos sério assim. Solene assim. Coisa estranha… O filho tira a espada da mão do pai. Diz:

– Pai, eu sou Thunder Boy.
– Thunder Boy?
– Garoto Trovão.
 – Muito bem, meu filho. Agora vamos pra cama.
– Espere. Esta espada. Estava escrito. Eu a receberia quando fizesse sete anos.

O pai se controla para não rir. Pelo menos a leitura de história em quadrinhos está ajudando a gramática do guri. “Eu a receberia…” O Guri continua.

– Hoje ela veio. É um sinal. Devo assumir meu destino. A espada passa a um novo Thunder Boy a cada geração. Tem sido assim desde que ela caiu do céu, no vale sagrado de Bem Tael, há sete mil anos, e foi empunhado por Ramil, o primeiro Garoto Trovão.

O pai está impressionado. Não reconhece a voz do filho. E a gravidade do seu olhar. Está decidido. Vai cortar as histórias em quadrinhos por uns tempos.

– Certo, filho. Mas agora vamos…
– Vou ter que sair de casa. Quero que você explique à mamãe. Vai ser duro para ela. Conto com você para apoiá-la. Diga que estava escrito. Era meu destino.
– Nós nunca mais vamos ver você? – pergunta o pai, resolvendo entrar no jogo do filho enquanto o encaminha, sutilmente, para a cama.
– Claro que sim. A espada do Thunder Boy está a serviço do bem e da justiça. Enquanto vocês forem pessoas boas e justas poderão contar com a minha ajuda.
– Ainda bem. – diz o pai.

E não diz mais nada. Porque vê o filho dirigir-se para a janela do seu quarto, e erguer a espada como uma cruz, e gritar para os céus “Ramil!”. E ouve um trovão que faz estremecer a casa. E vê a espada iluminar-se e ficar azul. E o seu filho também.

O pai encontra a mulher na sala. Ela diz:

– Viu só? Trovoada. Vá entender este tempo.
– Quem foi que deu a espada para ele?
– Não foi você? Pensei que tinha sido você.
– Tenho uma coisa pra te contar.
– O que é?
– Senta, primeiro.

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Gostou? 🙂
Este texto foi retirado do livro:

Luis Fernando Veríssimo é um dos grandes nomes da Literatura Brasileira. Adoro suas crônicas, sempre inteligentes e criativas e com o humor na dose certa. Alguns anos atrás a editora Objetiva adquiriu o direito de publicar as obras do autor, desde então foram publicados 8 livros de crônicas . As melhores já feitas com os mais diversos temas. Com o intuito de mostrar um pouco das obras do autor, de tempos em tempos irei transcrever algumas das melhores crônicas dos livro já publicados.

Espero que gostem da novidade e acompanhem os próximos textos. Nós, brasileiros, temos o péssimo hábito de fugir da leitura. Temos desprezo pela leitura. Eu gosto de ler desde criança, então sempre incentivei amigos, conhecidos, familiares e colegas ao hábito da leitura. Seja de livros, quadrinhos, jornais ou até internet. Realmente espero que os leitores do Blog curtam a idéia.

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